Ela comemora cem anos.

Minha mãe está fazendo 100 anos neste 31 de maio. Mesmo que não esteja em nenhum cômodo do apartamento, mesmo que não precise de agasalhos contra o frio (ela, que sentia muito frio nos pés e nas mãos), mesmo que dispense bolos e abraços, mesmo que não esteja sorrindo aos ver os filhos reunidos e os netos a chamar vovó. Mesmo que não atenda aos telefonemas para, com dificuldade de audição, ouvir a resposta a seu rápido alô.

Essa mãe, forte para parir e criar seis filhos, hoje tem uma força sobrenatural, em outro estágio, em outra dimensão. E continua presente na história que construiu em nós e conosco. Continua a sorrir, a aconselhar, a contar suas histórias, a lamentar a hora da despedida quando ultrapassávamos a porta de saída e a se queixar da vida presente, tão confusa, tão incompreensível, tão diferente.

Sabe, mãe, somente convivi com você 77 anos desse centenário que você comemora longe de nós. Não conheci você no tempo de sua infância, meninice e juventude, mas elas vieram com suas histórias do tempo passado fechar lacunas, dar a conhecer um pouco do que você viveu.

A gente é assim mesmo: o que não vivemos também se torna nossa história pela voz dos outros.

Por isso, mãe, aquela plaquinha de comemoração de seu centenário não existe, apenas ficou como palavras em seus ouvidos e na minha intenção. Faz mal não, mãe! Este bilhete não substitui a plaquinha e as homenagens. Mas igual a elas, fala de meu agradecimento por tudo que herdei, de corpo e de caráter. E de quanto sinto sua falta.

Parabéns, mãe! Você viverá muitos e muitos anos mais enquanto vivermos: meus irmãos, seus netos e bisnetos, genros e noras e todos os amigos que você fez na vida. Eles lembram com afeto da vó Pierina, da tia Pierina e da dona Pierina: as muitas mulheres que você foi.

Ah, aí ao lado do pai (esse centenário rapaz elegante e bonito), diz para ele que ele também faz falta e que ser órfão só é bom em romance que acaba bem. Pra valer, orfandade dói, dói.

Beijos e feliz aniversário!

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