Marta Morais da Costa

Depositou o chaveiro sobre a mesa. Não porque fosse deixá-lo à vista para não perder. Não porque fosse um peso a menos no bolso. Também não para demonstrar propriedades a que pudesse acessar diretamente. Talvez para demostrar a ela sua condição de proprietário, de posses garantidoras do futuro, de acesso a muitos lugares todos seus ou sob sua responsabilidade. Duas chaves podem abrir poucas portas: dezenas delas abrem portas de respeitabilidade e poder.
Distraidamente ela passeou os olhos sobre o molho de chaves. Fixou-se no chaveiro, uma gasta tira de couro com argolas, que reuniam diferentes tamanhos e formas de chaves. Os olhos deslizaram do molho para a mesa, em imbuia escura e aparentemente sólida. Viajaram até as paredes camufladas por um simples papel colorido lembrando flores impressionistas.
– Qual é sua resposta? – indagou com aparente calma e disfarçada curiosidade.
– Preciso responder agora? – ela retornou com dissimulada ingenuidade.
– Sim, precisa. Dependo dela para decidir meu futuro.
– Se for positiva?
– Inicio os preparativos.
– Se for negativa?
– Sairei de sua vida.
– E um talvez?
– Certamente não se aplica à minha pergunta.
– Então, dois minutos mais. Por favor.
Num aparente gesto descuidado, ele bateu delicadamente com os dedos no molho de chaves e as deixou mais visíveis para ela. Sobressaíam as chaves novas, brilhantes, maiores. As pequenas e coloridas, montavam o cenário para as protagonistas. O tempo escorreu por entre os interstícios do chaveiro.
– E então?
– Bem, sabe… pensando bem… minha resposta é não.
– Tem certeza?
– Absoluta.
– Lamento. Muito.
Juntou o chaveiro, as chaves tilintaram em despedida, a escorrer lágrimas de metal. Sumiram no bolso e ele sumiu na esquina, apagando-se do cenário.
Ela continuou sentada à mesa, semblante decidido, olhos secos e fixos em uma das flores do papel de parede. Sem portas nem chaves. Apenas a luz filtrada pela janela aberta, que não precisa de chaves. Mas que não dispensa a luz e a lua.