Marta Morais da Costa

Decidiu falar apenas o necessário. Abdicou das conversas animadas. O silêncio, companhia constante.
Gostou da sensação.
Surdez voluntária, mudez assumida.
Os olhos passam a construir cenários: personagens e paisagens avolumam-se em melhores cores e maior nitidez.
Ouve outras vozes, reais e imaginárias. Ressoam músicas recônditas.
Descobre no silêncio outras possibilidades. Histórias assomam ao desvelar o que a fala acobertava.
Decide deixar-se enlear. Carregara ao longo dos anos narrativas ouvidas e vividas, sufocadas, porém, por falas infindáveis. Mas no silêncio, elas se falam. Alegres e vivazes, trágicas ou ameaçadoras. São tantas e tão avassaladoras ocupando a cavidade da boca, enovelando-se nas pregas vocais, obstruindo as fossas nasais, perdendo-se nos labirintos dos ouvidos, invadindo os globos oculares e derramando-se pela face, descendo pelo peito e atingindo a extremidade das mãos que tentam conter a torrente.
Em vão.
As histórias encharcam os dedos e criam maremoto tão intenso que só amaina lançado sobre a areia do papel em ondas insofreáveis.
O silêncio conquista sua vastidão. Antes o desaparecimento no ar, agora o desenho das letras.
As histórias ascendem à sua casa.