Uma noite, uma fala: poesia só se cala é dentro do peito

Marta Morais da Costa

 “O verso é um doido cantando sozinho/ seu assunto é o caminho. E nada mais!/ O caminho que ele próprio inventa.”

(Mário Quintana)

Noite de maio, noite de outono, noite de lua crescente.

Estamos em ambiente universitário. Como em outras noites e outonos, me posiciono para uma conversa com público adulto de possíveis formadores de leitores.

Não para formar no sentido de colocar em fôrma, mas de pessoas que venham a tomar forma, como diferencia Eliana Yunes. E nessa diferença cabe a diversidade da Pedagogia. E da leitura, evidentemente.

Bem que eu sabia que escrever poesia tem um quê de encantamento.

Mas descobri mais uma vez que, em certa noite de outono, sem varinha e sem poção, a poesia “se fez carne e habitou entre nós”.

Porque a poesia envolvente se torna semente e, bem adubada e cuidada, floresce.

Assim, pegando um verso ali, uma estrofe aqui, a imagem em fuga e a sonoridade pródiga, a leitura em voz alta do poema desenhou em graves e agudos a música das esferas da beleza literária. O público veio comigo, sem deixar de ser ele mesmo.

Houve quem resistisse: não gosto de ler poesia é coisa de mulher e criança acho difícil tô nem aí pra poesia coisa chata…

Meia hora depois, olhos em brasa, ouvidos de quero mais: por que parou? parou porquê?

A mágica humana da escrita em versos que conversa com cérebro e coração aproxima, aquece, estimula, acolhe, desfaz muros, convida pra dança, faz do adulto criança.

Assim, em cumplicidade, a fala sobre poesia a um público atento deu razão e afirmou em mim a história de uma escrita em versos, a nova aventura, a viagem em águas desconhecidas.

Lembro fases e faces dessa escrita.

Botei beca pra escolher o título. Batizei com a prática e fiz crescer com a poética: No que der e vier a poesia põe a colher.

Cravei o ritmo, remexi o provérbio, convidei o leitor.

“Toda poesia é sutil ou não é poesia. Existem sempre muitas janelas fechadas no caminho de um poeta, mas ele, em vez de se espantar, escreve.” (José Castello)

Escrevi, coletei, botei ordem, trouxe ilustração. Vieram Márcia e Naotake. Veio a Insight.

Nasceu o livro: suas janelas, gavetas, quintais e caminho.

Vieram os amigos, abraços flores conversas de saudade risos de bom encontro: e  o livro ganhou asas, encantado nos olhos de seus leitores.

Agora ele está por aí, no mundo, crescendo criança-adulta. Deixando a casa natal para viver no meio de todos.

Que meu livro em seu caminho se espante, encante e seja reescrito.

Ficarei aqui, tomando os cuidados amorosos para que cresça e se fortaleça.