A TRAMA DO TEMPO

EDUARDO GALEANO

Tinha cinco anos quando foi embora.

Cresceu em outro país, falou outra língua.

Quando regressou, já havia vivido muita vida.

Felisa Ortega chegou à cidade de Bilbao, subiu no alto do monte Artxanda e andou o caminho, que não havia esquecido, até a casa que havia sido a sua casa.

Tudo parecia pequeno, encolhido pelos anos; e lhe dava vergonha que os vizinhos escutassem os golpes de tambor que lhe sacudiam o peito.

Não encontrou seu triciclo, nem as poltronas de vime colorido, nem a mesa da cozinha onde sua mãe, que lia histórias para ela, havia cortado com uma tesourada o lobo que fazia Felisa chorar. Tampouco encontrou a sacada de onde havia visto os aviões alemães que iam bombardear Guernica.

Pouco depois, os vizinhos tiveram coragem de contar: não, aquela não era a sua casa. Sua casa tinha sido aniquilada. Aquela que ela estava vendo tinha sido construída sobre as ruínas.

Então, alguém apareceu, do fundo dos tempos. Alguém que disse:

– Eu sou a Elena.

As duas se gastaram de tanto se abraçar.

Muito haviam corrido, juntas, naqueles bosques e arvoredos da infância.

E Elena disse:

– Tenho uma coisa para você.

E trouxe uma travessa de porcelana branca, com desenhos azuis.

Felisa a reconheceu. Sua mãe oferecia, naquela travessa, os biscoitinhos de avelã que fazia para todos.

Elena a havia encontrado, intacta, entre os escombros, e tinha guardado durante cinquenta e oito anos.

(In: GALEANO, Eduardo. Bocas do tempo.)